vendredi 5 septembre 2014

enfermagem no Québec (post em português) - capitulo 1

Esse blog nao tem um tema especifico, mas vejo que os posts mais populares sao os que tratam de imigraçao e enfermagem. Alors, voici uma série de posts sobre a enfermagem no Québec.

Para quem quer saber sobre enfermagem, seguem alguns posts que eu considero o Be-a-ba da coisa (ha mais de 60 posts com a tag **enfermagem** no blog, muita coisa, escolhi os que considero mais pertinentes ...)

enfermagem - basics
basics en français
o que o enfermeiro faz no QC
entrevista na Radio

Esses ai sao bem genéricos, informaçoes importantes e até bem explicadas. O que quero abordar nesses novos posts é como se passa o DIA-A-DIA de uma enfermeira, aqui no Québec, em diferentes setores ....

Desde que cheguei aqui eu atuei em = bloco operatorio; unidade hospitalar adulto (gastro-cirurgica e hepato como estagiaria e clinica médica como enfermeira); CHSLD; CLSC (volets EJF e cardio) e SAD. A sopa de letrinhas confunde ? Vou explicar conforme o texto for avançando, sem pressa. Serao alguns capitulos, hoje abordo o comecinho, a fase de estagiaria! 

O enfermeiro com diploma estrangeiro, apos ter a validaçao da ordem, pode ser encaminhado para um AEC (attestation d'étude collégiales) + estagio ou apenas estagio. Quando eu fiz meu processo, a opçao AEC+estagio era a unica disponivel para as brasileiras. Fiz no CVM em 2008-2009 (Cégep du Vieux Montréal) e minha experiência foi fantastica (4 meses de teoria e 2 de estagio). Hoje parece que as coisas mudaram ... 

Começando entao pela primeirissima experiência, como estagiaria nas unidades de gastro-cirurgia e pré e pos transplante hepatico, num hospital terciario-quartenario de Montréal:
Como estagiaria, é a professora quem assume na verdade como sendo a enfermeira responsavel do paciente (isso é praxe, estagiario em enfermagem nao tem poder, o *boss* é o supervisor!). Meu grupo de estagio era composto de 7 estudantes, eu sendo a unica brasileira. Nao falarei aqui sobre os trabalhos associados ao estagio, como *journal de bord* e *travail de relation d'aide*, e nem sobre a parte teorica do curso, ok? Vamos nos concentrar sobre a parte pratica da coisa ...

Bem, como funcionou comigo? Nos primeiros dias, cada um de nos ficava com apenas 1 paciente e apenas com procedimentos simples, como sinais vitais, medicaçoes PO, SC e IM. Nada de curativo, sonda nem NPP neste primeiro momento. Antes de cada medicaçao, a professora pedia a descriçao da droga, classe, efeitos desejados e efeitos secundarios. Coisas que enfermeiros devem saber, como a diarreia em alguns antibioticos, e o melhor horario para administrar Calcio, nada de outro mundo. 

Com o passar dos dias, e vendo a progressao e confiança dos alunos, a professora nos deixava com 2 pacientes. Lembrando que como era ela a responsavel final, ela nao poderia assumir mais do que 15 pacientes ao todo! Lembro de ter ficado com 3 pacientes em apenas 2 dias, e isso pois eram casos estaveis e sem muitos procedimentos. A maior parte dos pacientes da unidade de gastro-cirurgia eram casos bem complexos, quase semi-intensiva, com tubos para todos os cantos (cateter nasal, SNG ou gastrostomia, cateter central ou PICC-Line + acesso periférico, curativos gigantescos,  bomba de infusao com tripla conexao, SVD, sistema de compressao de pernas, todo o kit! E 1001 medicamentos, incluindo NPP, insulina e em alguns casos, até transfusoes = bref, casos bem complexos!). Na unidade de pré e pos transplantes os pacientes eram menos *conectados* (e foi justamente la que consegui assumir 3 pacientes).

Feita a breve descriçao do tipo de paciente que encontravamos nas unidades, fica facil deduzir que era trabalho pacas, sem parar. No Québec a enfermagem é basicamente assistencial, o que significa que um PAB (préposé aux bénéficiaires) faz o basicao de higiene e alimentaçao, e todo o resto (medicamentos, procedimentos, ensinamentos e avaliaçao clinica) é responsabilidade da enfermeira. Nesta unidade especificamente, tinhamos varios casos de isolamento, entao imaginem a trabalheira de se paramentar todinha a cada vez que entravamos nesses quartos! Nestas unidades so atuavam enfermeiros e PAB, nao tinhamos enfermeiros auxiliares.

O esquema de trabalho tenta ser logico, os horarios de procedimentos e medicamentos sao agrupados e em geral era possivel terminar os dias a tempo de escrever as notas e nao sair tao atrasada. Como eramos estagiarias, a pausa de janta (pois o estagio era das 16 às 23h = o horario padrao do hospital é 16 às 24h, mas para o estagio saiamos às 23h, nao sei se mudou!) era respeitado, tinhamos 45 minutos se nao me engano. = durante a pausa de janta, toda a turma de estagio descia junto para o refeitorio, a professora estava la quando passavamos o *mini* plantao para a enfermeira responsavel e garantia que nao tinhamos deixado nenhuma pendência para a equipe. Muito organizado.

A rotina de medicamentos neste hospital era simples, pois eles vinham ja em doses unitarias preparadas pela farmacia, inclusive os medicamentos injetaveis. E o NS (normal salin 0,9%, o soro fisiologico) vinha numa pratica seringa pré-preenchida com 10ml de soluçao, ja prontinho para o uso. Poucos pacientes precisavam de heparinizaçao classica. Os horarios de medicamentos também eram simples, 2 ou 3 durante todo o plantao, entao conseguiamos passar rapidamente por essa etapa. Medicamentos como heparina, insulina e sangue possuem protocolos especificos, como a verificaçao à 2 para evitar erros. Quem fazia a contra-verificaçao era sempre a professora e esses eram os momentos mais estressantes, assim como as conexoes de NPP (a professora estava sempre de olho e acompanhava de perto, para garantir que conectavamos na boa via do cateter, era quase paranoico).

Curativos e outros procedimentos geralmente sao feitos pelos enfermeiros do dia (8 às 16), entao na véspera a professora negociava com a ASI para podermos ter esses procedimentos no dia seguinte (pequena explicaçao sobre a ASI = assistant du supérieur immédiat, uma espécie de *enfermeira sub-chefe* de cada unidade, ela determina a escala de pacientes, a prioridade para procedimentos, a rotaçao de horarios de pausa e as duplas com os PAB, além de responder aos pepinos e ficar em contato com os médicos e outros profissionais, é a profissional que mais se assemelha ao que classicamente faz a enfermeira em unidades hospitalares no Brasil, assumindo mais gestao do que cuidados diretos). Apos a negociaçao com a ASI, eu assumi algumas sondas e alguns curativos. A técnica é revista durante o periodo  de aulas teoricas, nos laboratorios do Cégep, aqui usam os kits descartaveis ja prontos para curativos e sondas, e adoram-adoram-adoram fazer bandagens em curativos (viva o kling!). Na gastro-cirurgica os curativos eram gigantescos, tinha alguns casos de deiscências e mesmo curativos à vacuo. Cada curativo levava um tempao e a professora sempre estava ao lado quando realizavamos um procedimento pela primeira vez. Ela me viu fazer 2 sondagens, uma em mulher e outra em homem, me viu fazer um curativo enorme e um curativo de PICC-line. Puncionei algumas veias e ela estava la na primeira vez também. Depois ela me deixava fazer sem supervisao direta, mas alguns colegas de grupo foram acompanhados no mano-a-mano até o finzinho, por terem técnicas menos adequadas ou se sentirem menos confortaveis com esses procedimentos. 

Eu tive poucas oportunidades de fazer uma avaliaçao de pos-operatorio completa (os pacientes passavam do CC para a UTI e a transferência UTI-unidade em geral era pela manha) mas fiz varias pré-operatorias. Nao tive nenhuma urgência a administrar também.

Mas enfermagem nao é so procedimento, é uma profissao muito humana e muitas vezes tinhamos pacientes fragilizados, que choravam e que manifestavam ideias tristes. Dai entra o approche de relation d'aide, e a maneira quebeca de ser empatica, o que é bem estranho para quem vem do Brasil, uma cultura empatica por si. Fui super bem nesse quesito, mas de novo, tive colegas estagiarios que simplesmente nao sabiam o que fazer, era como se *ser enfermeiro* se resumisse à dar medicamentos e fazer curativos. Tsc, tsc, tsc ...

Fazer a educaçao ao paciente e sua familia também sao atribuiçoes de enfermeiros, e eu felizmente tive boas oportunidades durante meu estagio: uma para explicar sobre a manutençao de uma NPP à vie e outra para uma colostomia. Sao açoes bem *nursing*, que exigem além do conhecimento técnico uma boa dose de paciência e diferentes técnicas de ensino. O paciente que sairia com a NPP estava em plena fase de revolta, e foi um longo processo de quase 1 semana (tempo que infelizmente, nem todas enfermeiras possuem! = lembrem-se que ficavamos com apenas 2 ou 3 pacientes, e enfermeiras atuantes nesta unidade ficavam com 5 ou 6!!). Educaçao é uma das partes que mais gosto, mas de novo, alguns estagiarios eram péssimos, com didatica horrivel, nao adaptada ao nivel do paciente e informaçoes até mesmo erradas!

O estagio supoe que o enfermeiro estrangeiro ja conheça as técnicas, entao o foco nao é a quantidade. Eles querem que o enfermeiro se adapte às rotinas quebecas, o que inclui a maneira de escrever no dossiê e a inclusao do modelo de pratica de enfermagem adotado pelo hospital. Onde fiz estagio, era o modelo McGill e o PTI (Plan thérapeutique infirmier) ainda era novidade. Para fazer as notas, deveriamos ter terminado nossos casos antes das 21h30. A professora nos obrigava a escrever uma folha de rascunho, ela lia uma por uma e corrigia, e so depois é que poderiamos passar para o prontuario oficial. E isso foi até o ultimo dia de estagio, nenhuma nota era escrita diretamente no prontuario! Trabalho dobrado, né? Mas as folhas do prontuario sao super simples, quase so *marcar X* e poucas eram as notas descritivas.

Terminado nosso horario, la pelas 22h30, começavamos a passagem de plantao para a enfermeira **oficial** da unidade. Era uma etapa importante, aprender como se comunicar com os outros membros da equipe. A professora estava sempre de olho em como davamos as informaçoes e qual o nivel de detalhamento (nao pode ser algo nem muito superficial nem muito complexo, ja que a enfermeira nao tem a vida toda para ouvir os 7 estagiarios!). Depois, era voltar para o vestiario, trocar de roupa (pois como estagiarios eramos proibidos de entrar ou sair do hospital usando o uniforme) e voltar para casa.

Meu estagio era perto de casa, eu ia a pé. Mas outros colegas levavam quase 2h no trajeto. Nao podemos *escolher* o local de estagio.

Do meu grupo de 7 estagiarios, 1 foi reprovado. Eu fiquei no **top 3**, fechei com mais de 90%. Foi uma boa experiência, estava afastada da assistência ha milênios! Foram apenas dois meses, mas fundamentais para me ajudarem a entender ainda mais sobre a enfermagem no Québec.

No proximo capitulo da saga, a experiência como CEPI no bloco operatorio, espero que esse post tenha sido util para alguém rs
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10 commentaires:

  1. Gabi-enciclópedia de enfermagem!
    Hey, parabéns atrasado! Foi que dia exatamente?

    bjinz
    Erika

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  2. Salut, Gabi

    Adorei o post!!! Algumas dúvidas... Rsrs... Esse PAB é como se fosse um auxiliar ou técnico aqui no Brasil? Outra coisa, pelo que entendi a enfermagem no Québec dividi-se em enfermeiro assistencial e enfermeiro gerencial (chefe, supervisor...)? Mais uma coisa, le français, aulas no Brasil mais francization, conseguimos encarar o estágio???

    Bjus, Merci!

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    1. PAB seria um atendente. A lei 90 garantiu alguns direitos para procedimentos, mas devem ser bem enquadrados. Basicamente são cuidados de higiene, mobilização e alimentação.

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    2. Enfermagem no ambiente hospitalar é assistencial (a enorme maioria) , ensino, pesquisa e gestão. Ninguém começa nas categorias de ensino, pesquisa e gestão. Assistencial é a base de tudo aqui.

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  3. E sobre o francês, não há regra, mas é óbvio que não da pra encarar o estágio sem ter um nível no mínimo intermediário-avançado. :-) alguns atingem com 1 ano, outros com 3. Cada pessoa tem um ritmo

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  4. Oba, muito útil! Estou me atualizando aqui no blog. E essa ilustração final é perfeita ha ha ha ha :) Jaq

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  5. Gabi cheguei aqui por acaso . rs..
    Estou como doida procurando informações sobre enfermagem no Canadá ,obrigada pelos esclarecimentos,de longe se nota a diferença ao tratamento de nossa profissão.
    Termino minha graduação em 1 ano e meio e gostaria de ir para Quebec .Fiz dois anos de francês aqui no Brasil ,não sei se seria suficiente ? consigo falar bem .
    Espero que tudo esteja bem . Beijão !

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  6. Gabi, uma dúvida: é mais fácil ir para o Québec como técnico ou como enfermeiro formado?

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